Blog Tradução

sábado, 21 de maio de 2011

Carros x impostos - um problema que se impõe


Alta carga tributária no Brasil ajuda a complicar a venda e eleva o preço final dos automóveis

Uma rápida comparação do preço dos automóveis no Brasil com os mesmos modelos em outros países mostra uma gritante diferença contra o consumidor brasileiro. Mesmo depois das conversões cambiais, a disparidade do valor cobrado por aqui chega, em alguns casos, a 80%. Nem mesmo em relação a países vizinhos, membros do Mercosul, o Brasil fica em posição vantajosa. Essa situação pode ser explicada, em parte, pelos impostos. Dados da Anfavea – Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores – mostram que a média de participação dos tributos sobre os preços dos automóveis no Brasil é de 30,4%, uma incontestável liderança mundial – a Itália, segunda no ranking tem 16,7%. “ Infelizmente é um problema recorrente e histórico no Brasil ”, lamenta Ademar Cantero, diretor de relações institucionais da Anfavea.

São diversos os impostos cobrados na venda dos carros no país. Os mais importantes são o IPI – Imposto sobre Produto Industrializado – e o ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços. O primeiro é uma taxa federal, que varia de acordo com o tamanho do motor do veículo – 7% até 1.0 litro, 13%, para motores a gasolina e 11% para flex, entre 1.0 litro e 2.0 litros, e 25% acima de 2.0 litros. Já o ICMS sobre automóveis muda de estado para estado. “ É uma complexidade tributária enorme. Tanto a esfera nacional quanto a estadual precisam arrecadar. E isso acaba sendo passado para o consumidor final ”, explica Vander Mendes Lucas, professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília, UnB. Outros tributos com percentuais menores, como PIS e Cofins, também incidem sobre produtos automotivos. Sobre os automóveis importados ¬– excetuando-se os que vem de outros países do Mercosul e do México, com os quais o Brasil possui acordos de isenção de tarifas alfandegárias – ainda é cobrado o Imposto de Importação de “ salgados ” 35%.

A decisão do tamanho da alíquota cobrada em cada tributo é decidida através do princípio da essencialidade. Isso significa que qualquer produto no Brasil teoricamente tem impostos proporcionais a sua necessidade para o cidadão. Para o governo federal, o automóvel se enquadra na categoria de bem supérfluo. “ Essa avaliação é falha. O Estado não investe em infraestrutura de transportes coletivo como em outros países com grande arrecadação. Ter um carro no Brasil passa a ser uma necessidade, não uma opção ” critica Luiz Filipe Rossi, professor de Microeconomia e Finanças do Ibmec, instituição carioca de ensino.

Para tentar amenizar o impacto da grande carga tributária no setor, o Governo Federal facilita para as marcas com fábricas instaladas no país a importação de autopeças para a fabricação dos carros no Brasil. Alguns tributos federais referentes àquela peça só são pagos no momento da venda do automóvel e não quando ela entra no país. Além disso, a fabricante ganha um desconto nessas taxas. “ O problema é que alguns fabricantes estão sendo autuados por usarem os dois benefícios juntos, o que é legal. Nesse caso, o que acontece é simplesmente uma falta de conhecimento da lei ”, aponta a Dra. Bianca Xavier, sócia e especialista em setor tributário da Siqueira Castro Advogados.

As previsões para o futuro também não são nada animadoras. “ Vemos que hoje nada acena para que o governo modifique a sua avaliação em relação a necessidade do carro para o brasileiro. Não há vontade política para tal ”, critica João Eloi Olenike, presidente do IBPT – Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, entidade independente que orienta sobre práticas de governança tributária. “ Se o Brasil não começar a cuidar da sua galinha dos ovos de ouro, que é a indústria automotiva, pode perder a sua produção para os vizinhos. Como a Argentina, onde os impostos são menores ”, alerta Dra. Bianca Xavier, da Siqueira Castro Advogados.

Instantâneas

# O Brasil lidera o ranking mundial de participação dos tributos sobre automóveis no preço passado ao consumidor, com média de 30,4%. Em seguida vem a Itália e Reino Unido, com 16,7%, França com 16,4% e Alemanha com 16,0%.
# O Recof é o sistema que assegura benefícios de imposto para as marcas com fábricas instaladas no Brasil.
# O setor automotivo foi um dos primeiros no Brasil a ter impostos exonerados na época da crise mundial, com a redução do IPI.

Briga de vizinhos

No último dia 12 de maio, o Governo Federal decidiu dificultar o acesso de veículos importados para o Brasil. A partir desta data, comprar um automóvel vindo de fora terá que passar por uma licença prévia para a liberação de guias. Isso implica em uma maior demora na chegada desses produtos ao mercado brasileiro. A medida é parecida com a que o governo argentino fez para proteger o mercado interno. Em nota à imprensa, José Luiz Gandini, presidente da Abeiva – Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos Automotores e da marca coreana Kia criticou a decisão do governo. “ Se valesse apenas para o país vizinho seria válida, mas não concordamos com extensão dessas medidas a veículos provenientes de outros países ”, reclama Gandini.

As autoridades argentinas também ficaram preocupadas com a ação brasileira. Com ela, mais de três mil carros já ficaram barrados na fronteira entre os dois países. Em declaração, Aníbal Borderes, presidente da Adefa, Associação de Fábricas de Automotores da Argentina – o equivalente a Anfavea – fez duras críticas às novas barreiras. “ Elas levantam dúvidas sobre o andamento do Mercosul, que já demonstrou ser instrumento válido para o crescimento e desenvolvimento dos países da região ”, pondera Borderes.

Vale lembrar que a Argentina adotou recentemente medida semelhante com o objetivo de proteger o seu produto interno, dificultando as importações. O Ministério do Desenvolvimento brasileiro, no entanto, nega que a medida seja uma retaliação direta a Argentina. A justificativa é que a decisão vem com o objetivo de monitorar o fluxo comercial de veículos importados. “ Acho uma boa política. Principalmente porque tem como objetivo aumentar a aquisição de veículos no mercado interno, incrementando a nossa economia ”, avalia João Eloi Olenike, presidente do IBPT – Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário.



Fonte: Uol

Nenhum comentário:

Postar um comentário