JT afasta justa causa aplicada por empresa que preparou armadilha para empregado
Nas ações que tramitam perante a JT mineira, é comum o fato de juízes trabalhistas se depararem com figuras típicas do direito penal. Exemplo disso é a ação julgada pela juíza Camilla Guimarães Pereira Zeidler, titular da Vara do Trabalho de Santa Rita do Sapucaí. Em sua análise, a magistrada concluiu que a conduta da empresa reclamada assemelha-se à figura penal do "flagrante preparado", que ocorre quando alguém, de forma traiçoeira, provoca o agente a praticar o crime, ao mesmo tempo em que adota providências para que este não venha a se consumar. Ou seja, no entender da julgadora, há indícios de que a empresa, pretendendo fundamentar a justa causa aplicada ao ex-empregado, preparou uma armadilha, com o intuito de induzi-lo à prática de determinada falta.
Conforme relatou o reclamante, a falta que fundamentou a rescisão contratual foi o lançamento incorreto de informações quando do preenchimento de planilhas de controle de matéria-prima e produtos produzidos, bem como a rasura de dados. O trabalhador argumentou que a aplicação da dispensa motivada foi injusta, tendo em vista que ele não colocou a empresa em risco, apenas obedeceu ordens superiores. O ex-empregado entende que, na verdade, o ato de empresa foi retaliação em razão do seu pedido de transferência de setor. Além disso, ele ressalta que a reclamada, ao aplicar-lhe a penalidade, não observou a imediatidade e nem a gradação exigidas. Por fim, o trabalhador alegou que sofreu assédio moral pelo fato de ter sido obrigado ao preenchimento das planilhas relativas à produção de colegas. De acordo com as ponderações da julgadora, em se tratando de improbidade, é a desonestidade que precisa ser provada para justificar a dispensa motivada. Nesse contexto, a juíza salienta que deve ser entregue à reclamada a incumbência de provar que o ex-empregado agiu com a intenção de lesar terceiros e que o incidente se revestiu de gravidade suficiente para motivar a aplicação da justa causa.
Examinando o conjunto de provas, a magistrada concluiu que a ex-empregadora agiu com rigor extremamente excessivo, adotando medida que não se ateve aos limites da proporcionalidade. Isso porque, no histórico da relação jurídica entre as partes, que perdurou por mais de dois anos, não consta nenhuma nota desabonadora da conduta do empregado. Ao contrário, por meio dos depoimentos prestados pelas testemunhas da própria reclamada, a juíza verificou que o reclamante tinha importância fundamental na cadeia produtiva da ré, porque detinha o conhecimento necessário de operação das máquinas utilizadas pela empresa. Para a magistrada, os depoimentos das testemunhas evidenciaram o conhecimento técnico do reclamante, bem como o bom serviço prestado pelo trabalhador de compartilhar as informações com os colegas e seu espírito de colaboração com a empresa na formação de empregados capacitados. Por isso, a juíza entende que caberia nessa situação uma simples advertência e, caso a medida fosse insuficiente, aí sim poderia a ré lançar mão da gradação das penas.
Mas não é só isso. "Evidências surgem no sentido de que a reclamada, na verdade, elaborou uma armadilha, induzindo o reclamante à prática de determinada falta, para fins de justificar a rescisão contratual como imposição de pena", observou a julgadora. O encarregado de produção da empresa, ouvido como testemunha, confessou que, cumprindo plano engenhado pelo gerente de produção, propositadamente, deixou em branco planilha de apontamento e pediu, novamente, ao reclamante para preenchê-la, já aguardando eventual deslealdade do empregado no repasse das informações para a ficha. Na percepção da magistrada, essa conduta assemelha-se à figura penal do "flagrante preparado", fenômeno frequentemente repudiado pelos juízes e tribunais da área penal, sendo o assunto tratado na Súmula 145 do Supremo Tribunal Federal. Segundo a doutrina penalista, em casos dessa natureza há a presença do elemento subjetivo do tipo, porém, sob o aspecto objetivo não há violação da norma.
Portanto, no entender da julgadora, ainda que se admita que o reclamante tenha praticado conduta desleal, as circunstâncias desse caso excluem, por assim dizer, a responsabilidade exclusiva do trabalhador, já que houve a efetiva participação da própria empregadora. Em face disso, a juíza sentenciante anulou a dispensa motivada e, considerando o contrato de trabalho encerrado sem justa causa, condenou a empresa ao pagamento das verbas rescisórias correspondentes.
Como a reclamada não impediu que circulasse no ambiente de trabalho a notícia da aplicação da justa causa pelo fato de o reclamante estar rasurando documentos da empresa, a julgadora entende que houve violação à honra do trabalhador e, por essa razão, ela condenou a ex-empregadora a pagar indenização por danos morais, no valor de R$2.000,00. Não cabe mais recurso da decisão.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho - 3ª Região
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